Ser psicóloga
- bethsmorais
- 27 de ago. de 2024
- 2 min de leitura
Atualizado: 24 de set. de 2024

Pelo caminho já vou me preparando. Preocupo-me em como vou chegar. Há 31 anos, coloco-me inteira para um novo encontro. Sinal de respeito. Em alguns minutos vou tocar em outra vida. Pode ser pela primeira vez, ou não. Mas este momento será inédito, mesmo que seja com alguém já conhecido. Portanto, ouço uma música relaxante, estimulo pensamentos edificantes e releio o percurso que já fizemos até aqui, caso seja uma pessoa que já acompanho.
O interfone anuncia a sua chegada. “Pode subir” - respondo ao porteiro. A campainha toca e, enquanto me dirijo até a porta, faço o sinal da cruz e respiro profundamente. Em alguns segundos, estenderei a minha mão para receber a dor de alguém.
Abro a porta, os olhares se encontram e o convite para entrar é feito. Nesse momento, sorrisos podem acontecer, confirmando a conexão. E assim, com simples gestos, peço licença para me aproximar da sua história.
Caminhamos até o assento e trocamos impressões sobre o dia. Nesse pequeno espaço, já consigo sentir a dinâmica dos seus passos e a entonação da sua voz. Sentamos. Vínculo estabelecido. Escuto o que traz e, quando necessário, vamos, aos poucos, abrindo as janelas para novas paisagens, ou provocando novos olhares para lugares já conhecidos.
Por vezes, precisamos utilizar o verbo refazer. Refazer significa reescrever o seu trajeto existencial com releituras necessárias para que haja um entendimento que sustente os motivos para seguir em frente. Em outras vezes, praticamos o verbo recomeçar. Recomeçar sugere o encerramento de círculos viciosos. Nem sempre é confortável, pois, apesar do incômodo que geram, esses círculos são engrenagens já conhecidas. Dar luz ao inexplorado, trazendo o desconhecido para uma apresentação, pode gerar medo. Nem sempre é fácil se despedir de quem já sabemos que somos. Mas, se existe o sintoma da dor, é sinal de que aquele formato não é mais bem-vindo. E, como quem lapida uma joia, incentivo o processo de autoconhecimento com todo o cuidado e amabilidade.
Ao término da sessão, com a mão estendida, convido aquela pessoa, que confiou em mim, para um abraço. Ali, asseguramos o nosso acordo de segurança e esperança.
Ao fechar a porta, agradeço por mais uma oportunidade de Ser psicóloga e me refaço. Há dias, em que a dor do outro já foi a minha.
Abraço fraterno,
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